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EDUCAÇÃO FÍSICA

 

Dar uma definição precisa da educação física não é tarefa fácil. Digamos que, no âmbito académico, existem diferentes concepções e enfoques relacionados com o termo. A educação física pode ser uma atividade educativa, recreativa, social, competitiva ou terapêutica, por exemplo.

 

No que diz respeito ao seu lado educativo ou formativo, a educação física é uma disciplina científico-pedagógica, que se centra no movimento corporal para alcançar um desenvolvimento integral das capacidades físicas, afetivas e cognitivas do sujeito.

 

Posto isto, acredita-se que a educação física seja uma disciplina e não uma ciência, pelo facto de não estudar nenhum objeto em particular, mas antes por tomar elementos de diversas ciências para conformar o seu quadro de aplicação.

 

Quanto à questão do desenvolvimento integral do individuo, a educação física vai mais além da antiga ideia do ser humano como sendo a soma do corpo, da mente e da alma; antes pelo contrário, trabalha sobre todos os aspectos da pessoa enquanto unidade.

 

As várias correntes da educação física podem definir-se de acordo com a forma em que é focalizada a disciplina. Existem correntes que se baseiam na educação (o seu campo de acção é a escola e o sistema educativo em geral), na saúde (considera-se a educação física como sendo um agente promotor da saúde, na medida em que serve para prevenir doenças), na competência (a disciplina como treino ou preparação desportiva para o desenvolvimento do chamado alto rendimento), no lazer (atividades lúdicas para vincular o sujeito com o meio) e na expressão corporal (a partir da influência que recebe da dança, do yoga e da música).

​DISCÓBOLO DE MYRÓN

Por estar baseado nos movimentos do corpo humano em ação, o Discóbolo de Myrón é reconhecido como o símbolo da Educação Física.

 

Discóbolo ("O arremessador do disco") do escultor grego Myrón, feito em mármore, datado de 450 a.C. (Século V. A.C.), representa um atleta momentos antes de lançar um disco.

 

Nesta estátua, o corpo revela um cuidadoso estudo de todos os movimentos musculares, tendões e ossos que fazem parte da ação; as pernas, os braços e o tronco inclinam-se para imprimir maior impulso ao golpe; o rosto não parece contorcido pelo esforço, mas calmo e confiante na vitória. 

 

É uma figura em ação. Seu equilíbrio baseia-se num equilíbrio dinâmico. Nesta e em outras esculturas clássicas pode-se apreciar a perfeita coesão das partes, todas contribuindo para um mesmo objetivo geral da composição.

 

Outras  características da escultura são a harmonia, o balanceamento e a simetria das proporções corporais. Assim como tantas outras obras gregas, perdeu-se o original feito de bronze e restaram apenas cópias romanas. Uma destas cópias encontra-se no Museu Nazionale Romano, em Roma, Itália.

 

Myrón (+ c. 423 a.C.) foi assim o mais famoso escultor em bronze do Estilo Severo. Ele capturava o movimento paralisado, fixou em Discóbolo o instante complexo dos músculos organizados de todo o corpo, em sincronia com o impulso dos braços, inclusive com o cálculo sereno da cabeça pensante, que nos mostra, como referido anteriormente, o atleta com o corpo flexionado, no instante anterior ao arremesso do disco.

 

O LANÇAMENTO DO DISCO, criado na Grécia mitológica, é considerada a mais antiga prova de arremesso do atletismo. Supõem-se que os primeiros discos eram de pedra e não tinham o formato atual, ou seja, os implementos vêm sofrendo aperfeiçoamentos através dos tempos até alcançarem o formato circular de hoje.

 

​HISTÓRIA DA ED. FÍSICA

 

Tudo começou quando o homem primitivo sentiu a necessidade de lutar, fugir ou caçar para sobreviver. Assim o homem à luz da ciência executa os seus movimentos corporais mais básicos e naturais desde que se colocou de pé: corre, salta, arremessa, trepa, empurra, puxa e etc.

 

A prática de atividades físico-desportivas foi  e continua a ser uma das constantes do comportamento humano. A manifestação cultural da atividade física produziu-se de formas diferentes, em função das necessidades sociais e dos objetivos estabelecidos em cada período histórico e civilização: assim, tem sido vista como atividade utilitária que possibilita a sobrevivência; como preparação para a guerra; como meio de invocação religiosa; como jogo ou atividade recreativa e de ócio; como método de educação física para a saúde; ou então como desporto espetáculo e de competição. Hoje em dia, para poder entender o conceito de educação física é conveniente conhecer a influência que as distintas civilizações exerceram sobre ela ao longo dos séculos. Dependendo do seu objetivo, cada cultura estabeleceu um modelo de educação física diferenciado, que em muitas ocasiões ainda perdura.

 

GRÉCIA ANTIGA

 

Os gregos da Antiguidade conferiram ao exercício físico um papel de grande destaque nos vários âmbitos da vida social, como a educação, na qual a atividade física se complementava com a aquisição de conhecimentos, e a celebração das festas, nas quais os jogos atléticos helénicos - fundamentalmenTe os Jogos Olímpicos tiveram especial transcendência. Tanto através da leitura dos grandes clássicos da poesia e da filosofia (Homero, Píndaro, Platão, Aristóteles, etc.) como através dos achados arqueológicos é possível perceber a importância que tiveram a educação física e a prática do desporto numa das grandes civilizações do Mundo Antigo.

 

A Ilíada, a primeira obra-prima da literatura grega, e a Odisseia (ambas compostas por Homero provavelmente cerca do ano 800 a. C.) contêm inúmeras referências desportivas, como, por exemplo, a realização de jogos fúnebres em honra de personagens ilustres. É muito provável que exista uma relação entre as duas grandes obras homéricas e os Jogos Olímpicos, já que nas suas páginas aparecem quase todas as categorias olímpicas: corridas de carros (as designadas bigas), corridas, salto, lançamentos do disco e do dardo, luta e pugilato; também existe uma intenção educativa, ao visar a honra e a perfeição ou, em suma, o areté, o ideal humano da virtude.

 

Quanto ao poeta Píndaro (518-438 a. C.), a sua mensagem educativa baseia-se no engrandecimento do vencedor desportivo, o qual é tomado como exemplo da perfeição; daí que as suas Odes triunfais (Olímpicas, Píticas, Nemeias e istimicas) sejam dedicadas precisamente ) aos vencedores dos vários Jogos.

 

EXERCÍCIO FÍSICO PARA OS GRANDES FILÓSOFOS

 

Por outro lado, Platão (427-347 a. C.), que tinha sido um lutador notável, deu grande importância ao desporto na educação dos jovens helenos. Na sua obra Uma República, defende que a música e a ginástica harmoniosa e simples - por esta ordem - são as duas disciplinas educativas que devem combinar-se para alcançar a perfeição da alma. Desta forma é visível formar jovens equilibrados, que não serão nem brandos nem brutos. Neste caso, trata-se de uma ginástica com objetivos filosóficos e, como tal, oposta ao culto do corpo (aspeto este criticado pelo filósofo de Atenas). O objetivo é impelir a alma para o bem através de um conceito estético e higiénico.

 

Aristóteles (384-322a. C.) considerava como disciplinas educativas a escrita, a leitura, a ginástica, a música e, por vezes, o desenho. Acreditava que a ginástica era útil porque fomentava o valor, pela sua vertente competitiva, melhorava a saúde (ideia que o afastava do seu mestre Platão ) e aumentava a força, protótipo das qualidades físicas. É curioso constatar como o grande filósofo de Estagira já alertava na sua época contra o perigo da especialização precoce e da busca prematura de campeões a qualquer preço (um tema tão em voga atualmente). Segundo ele, as crianças não deviam realizar treinos duros antes da puberdade, nem nos três anos seguintes, uma vez que isso prejudicava o seu desenvolvimento biológico; e lembrava que eram muito poucos os desportistas que, tendo sido destacados na idade juvenil, conseguiram ser depois campeões olímpicos.

Pelo contrário, os Espartanos (Lacedemónios ou Lacónios) eram a favor de submeter as crianças a intensivos treinos.

ESPARTA versus ATENAS: 

 

A Educação Física desempenhava um papel fundamental no sistema educativo grego, pois fazia parte do ansiado equilíbrio harmónico entre as aptidões físicas e intelectuais. No entanto, convém estabelecer uma distinção entre dois conceitos opostos da educação física: a arcaico-aristocrática de Esparta e a clássico-democrática de Atenas.

 

A mentalidade espartana, fundamentalmente guerreira, orientava a educação física das crianças para o combate. Assim desde muito pequenos, tanto meninos como meninas recebiam em Esparta uma dura preparação física, na qual até se utilizava a crueldade. Já aos 7 anos de idade eram separados dos seus pais e passavam a depender exclusivamente do Estado. Só as crianças de compleição forte eram consideradas dignas de receber educação; as débeis eram excluídas ou mesmo assassinadas. Os jovens exercitavam-se fora da cidade, no dromos (Iugar para correr), ou, dentro dos seus limites, na palestra (recinto para a luta). Esparta foi a grande dominadora nas primeiras edições dos Jogos Olímpicos (sendo os velocistas especialmente admirados), mas com o passar do tempo a participação foi diminuindo, já que praticamente o seu único interesse radicava em preparar-se para a guerra.

 

Pelo contrário, em Atenas, o conceito aducação física era muito diferente. Desde os 14 anos, os rapazes exercitavam-se num recinto privado, a citada palestra, onde, sob os sábios conselhos do pedótriba, praticavam salto, disco, dardo, solos (espécie de lançamento de peso), acrobacias, danças, etc.; inclusivé existia uma teoria do treino, na qual se aplicavam os princípios da especificidade e individualização. Não são poucos os exercícios praticados naquela época que coicidem ainda com os da educação fisica escolar atual. Também existiam diversos sistemas de treino, cada vez mais especializados, bem como uma parte destinada ao aquecimento no início de cada sessão.

O pedótriba dirigia a instrução na palestra e era ajudado pelos alunos mais velhos. Utilizava sistemas de ensino autoritários baseados no «certo-errado». Cumpridos os 18 anos, o jovem passava para o colégio dos efebos e, a partir de então, o Estado encarregava-se da sua educação. Após a sua passagem pela palestra, os jovens atenienses dirigiam-se aos ginásios, que viveram uma época de esplendor a partir do século IV a. C.

 

O ambiente dos ginásios culturalmente não podia ser melhor: eram utilizados para a preparação física dos dos atletas, exibiam obras dos melhores artistas (que tinham como modelos os próprios atletas) e reuniam os filósofos, que precisamente ali ensinavam as suas doutrinas (como Platão na Academia e Aristóteles no Liceu, dois dos principais ginásios atenienses). O ginasiarca encarregava-se de dirigir o ginásio, e o ginaste, treinador, ensinava os exercícios físicos. Este último tinha também uma formação completa em medicina, fisiologia e dietética.

O PAPEL COMPLEMENTAR DOS JOGOS TRADICIONAIS

 

Além do desporto e da educação física; os Gregos desfrutavam também dos jogos, não incluídos nos festivais de atletismo, que serviam para ocupar as horas de descanso e de ócio. Entre eles encontram-se inúmeros jogos tradicionais que, de uma forma ou de outra, perduraram até aos nossos dias; por exemplo: berlinde, aro, pião, macaca, balouço, tabas, saltar ao eixo, andar «a cavalo" com o colega, o ioiô, jogos de azar com dados, jogos de bola, etc. A progressiva decadência da educação física na Grécia antiga surgiu a partir da crescente influência exercida pelos filósofos sofistas, que se centravam exclusivamente na educação inteletual, em detrimento da cultura física.

DECADÊNCIA DA EF EM ROMA

 

Em Roma, tanto na época republicana como na imperial, quebrou-se o conceito integral da educação física, que se limitou a uma ginástica higiénica e de saúde em termas e palestras. A preparação física só fazia parte da instrução dos soldados a partir dos 14 anos. Cultivava-se o pragmatismo e desejava-se a beleza, a técnica e o prazer desportivo. Ao contrário do que tinha sucedido na Grécia, no mundo romano primava o jovem como espetador dos grandes espetáculos do circo (Iudi) e do anfiteatro (munera), cada vez mais populares e numerosos.

 

Desvinculados do caráter religioso que tiveram na civilização helénica, estes espetáculos adquiriram uma função política, sobretudo sob o Império. De facto, já no ano 105 a. C., durante a República, o Senado instituiu oficialmente o combate de gladiadores como espetáculo nacional. No cenário do anfiteatro os gladiadores profissionais enfrentavam-se entre si (mirmilões, reciários, trácios, samnitas), ou então contra as feras, embora também houvesse lutas entre animais. Tudo isto com uma crueldade extrema e com um final que normalmente significaria a morte de um dos combatentes. Existiam escolas de treino de gladiadores, que frequentemente eram presos ou escravos, mas também homens livres em busca de fama. Estas lutas terminaram no século IV d. C. com o Edicto de Milão. Entre o público romano, também tiveram grande continuidade as corridas de carros (sobretudo, as quadrigas, puxadas por quatro cavalos e conduzidas pelos aurigas) que se realizavam nos circos (como o Máximo, cuja etapa de esplendor se situa entre os séculos I a. C. e I d. C.), num percurso aproximado de quatro quilómetros.

IDADE MÉDIA - A CRISE DO EXERCÍCIO FÍSICO

 

Uma vez desaparecida a ginástica higiénica, o único vislumbre de preparação física intensa durante o período medieval foi a levada a cabo pelo cavaleiro feudal, orientada para a guerra, torneios e justas. A crise que a educação física atravessou durante o longo período que vai do século VI ao século XIV deveu-se fundamentalmente ao espiritualismo imposto pela Igreja, que procurava prioritariamente a saúde (ou salvação) da alma, condenava o orgulho da vida terrena e menosprezava toda a atividade físico-desportiva. O facto de o cristianismo associar, em geral, a barbárie dos espetáculos romanos, onde os crentes tinham sido objeto de inúmeros sacrifícios sob o Império Romano, à atividade física de caráter lúdico, influenciou de forma negativa a imagem do desporto. Assim, o atletismo, por exemplo, que tinha sido a base da educação física na Grécia antiga, praticamente desapareceu na Idade Média.

 

Por isso, como expoente quase único da educação física pode citar-se o treino que os jovens recebiam para se tornarem cavaleiros, depois de passarem, desde crianças, pelas categorias de pajem e escudeiro. Na sua preparação aprendiam esgrima, equitação, tiro, luta, natação e outras habilidades físicas. A concreção dos ideais de cavalaria tinha como marco as justas (confrontos entre dois cavaleiros) e torneios (verdadeiras batalhas que dois grupos de cavaleiros enfrentavam). Também adquiriram grande importância os jogos de bola.

 

 

A AT. FÍSICA NA AMÉRICA PRÉ-COLOMBIANA

 

Nas culturas mesoamericanas pré-colombianas (olmecas, maias, aztecas, etc.), os jogos de bola, com as suas distintas variantes, adquiriram uma grande importância social e, inclusivé, faziam parte das cerimónias rituais mais vastas. Tanto os restos arqueológicos como as fontes escritas certificam a existência de jogos nos quais se golpeava a bola de diversas formas e, nalguns casos, devia-se fazê-Ia passar por um orifício feito no centro de uma pedra grande. Existem restos de inúmeras canchas (campos destinados a jogos), como na cidade de Chichénitzá ou na península do Yucatán (Maias) e em Tenochtitlan, a grande cidade dos Aztecas, fundada no vale do México no ano de 1325. Também as mulheres participavam nos jogos de bola. Dada a importância destes jogos e a grande habilidade que os jogadores demonstravam, supõe-se que existiu uma preparação ou ensino desde a idade juvenil.

 

 

RENASCIMENTO E HUMANISMO

 

Após a Idade Média, o interesse que despertou a cultura clássica fez com que a educação física voltasse a ser apreciada no Renascimento e, sobretudo, pelo humanismo, a partir do século XVI. Influenciado por Petrarca e Rabelais, o médico humanista Jeronimus Mercurialis publicou em 1569 Arte Ginástica, obra na qual recuperou a teoria da ginástica greco-romana, sobretudo no sentido do exercício físico para a saúde. A atividade física orientou-se basicamente para a vertente higiénica, em detrimento da formação de atletas (aspeto que não se recuperaria até finais do século XIX). Baltasar de Castiglione, na sua obra O Cortesão, traçou a imagem do perfeito cavalheiro renascentista, incluindo inúmeras referências à educação física, que estava incluída no conceito de educação integral e servia para a expressão da personalidade do indivíduo.

BASES DA EDUCAÇÃO FÍSICA MODERNA

 

A partir do século XVIII, o Século das Luzes, apareceram inúmeros filósofos, pedagogos e pensadores que fixaram as bases da educação física moderna e influenciaram as escolas e sistemas posteriores. Assim, Jean Jacques Rousseau (1712-1778), influenciado por John Locke, é o precursor da pedagogia contemporânea. Na sua obra Emílio expôs as suas teorias, baseadas na educação da criança em contacto com a natureza, espontânea e autodidata. A educação física adquiriu grande relevância através de um método de aprendizagem indutivo («quanto mais fosse a atividade física, maior seria a aprendizagem»); também prestou grande atenção à psicologia evolutiva e ao respeito pelas leis naturais de desenvolvimento da criança, princípios muito valorizados atualmente. Segundo Rousseau, a criança, até aos 12 anos, devia realizar exercícios de educação sensorial: equilíbrios, habilidades manuais, orientação, etc. Este grande pensador de origem suíça influenciou decisivamente uma série de filósofos e pedagogos, tanto contemporâneos como posteriores, entre os quais cabe destacar Bassedow, Kant, Pestalozzi e Amorós.

 

Bassedow (1723-1790) foi um destacado representante da pedagogia da ilustração e do racionalismo e precursor da educação física alemã, devido às suas influências sobre Muths e Jahn. Defendeu a importância da educação física e levou as suas teorias à prática na Escola Philantropinum (criada em 1774), primeira escola na Alemanha onde os exercícios físicos fizeram parte do programa escolar. A sua didática estabeleceu a progressão do simples ao complexo e do parcial ao total.

 

O filósofo Immanuel Kant (1724-1804) dividiu a educação em física e prática. Mas o seu conceito da primeira incluía não só o desenvolvimento das qualidades físicas, como também componentes psíquicos, o desenvolvimento da inteligência, da memória, do caráter, da atenção, etc. O seu rigor pedagógico favoreceu o jogo com finalidade educativa, para fortalecer a criança e educar os seus sentidos.

 

O suíço Giovanni E. Pestalozzi (1746- 1827), autor de inúmeras obras, matizou muitas ideias de Rousseau. Defendia a figura do mestre e a educação da criança na família e na sociedade (sem isolá-Ia na natureza, como aquele propunha). Visto que procurava o desenvolvimento harmónico dos diferentes âmbitos do ser humano, concedeu muita importância à educação física (duas horas por dia), tanto à natural e instintiva como à planificada e sistemática, ginástica elementar dada pelo educador. O cuidado da higiene, os passeios nas horas das aulas, os jogos desportivos e a atenção às necessidades de cada criança também fazem parte das suas teorias. É o precursor da ginástica analítica.

 

Francisco de Paula Amorós y Ondeano, marquês de Sotelo (1770-1848), instruído e afrancesado, foi um dos precursores da educação física em Espanha, ao criar e dirigir o Instituto Pestalozziano de Madrid; perseguido durante a repressão absolutista que teve lugar após a Guerra Peninsular, teve de exilar-se em França. Em Paris dirigiu o Ginásio Normal Militar, instituição a partir da qual difundiu as suas teorias inclusivé no âmbito cívil. Influenciado pelas ideias de Rousseau, Muths e dos círculos militares, estabeleceu um programa de educação física militarista, pouco pedagógico e de difícil execução, com inúmeros exercícios acrobáticos. Os seus objetivos eram a saúde, o prolongamento da vida, o aperfeiçoamento das faculdades físicas, a melhoria da espécie e virtudes raciais, e concedeu muita importância à concorrência de todos os sentidos.

 

 

A ESCOLA ALEMÃ

 

Na escola de ginástica alemã destaca-se a figura de Guts Muths (1759-1839). Muths desenvolveu um método sistemático de educação física, reunido na sua obra A Ginástica da Juventude. Dividiu o seu sistema de exercícios em fundamentos de força (saltos, corridas, luta), de agilidade (natação, lançamentos, escalada, balanços, equilíbrio) e para a harmonia (dança, marcha, ginástica). Os seus objetivos didáticos eram conseguir uma educação integral. O jogo devia ser planificado, com objetivos lógicos. Nas suas teorias primavam o individualismo, a falta de livre iniciativa do aluno, a competitividade, a obsessão pelas marcas e pelos resultados. Muths influenciou o desporto moderno e a exaltação de sentimentos patrióticos através do exercício físico.

 

Seguindo os passos de Johann G. Muths, pai do idealismo alemão, Friedrich Jahn (1778-1852) manteve umas fortes convicções nacionalistas que o levaram a desenvolver, entre 1811 e 1819, o seu sistema de ginástica. Entendia que a ginástica, os exercícios, os jogos e as competições deviam servir para devolver a força e o vigor da alma, e isso era o que, segundo o seu ponto de vista, o povo germânico necessitava. O seu sistema, o Turnkunst, reunido na sua Cultura Ginástica Alemã (1816), incluía jogos violentos, corridas, saltos, luta, barra fixa, paralelas, o primeiro salto de cavalo, etc. Professor de educação física em Berlim, Jahn foi um revolucionário que originou forte polémica na sua época, e cujas ideias o levaram mesmo à prisão. A evolução do seu sistema conduziu-o à ginástica desportiva.

 

 

OS SISTEMAS ANALÍTICOS: A GINÁSTICA SUECA

 

O sistema de ginástica sueca teve grande repercussão em todo o mundo até à segunda metade do século xx, tanto na educação física escolar como na formação de carácter militar. O seu criador foi P. E. Ling (1776-1839), que, ao contrário de Jahn, ficou bem visto pelos círculos de poder. Homem de vasta cultura, Ling idealizou uma ginástica com objetivos higiénicos e médicos, de saúde e reabilitação, e em 1813 fundou o Real Instituto Central de Ginástica de Estocolmo, onde aplicou as suas teorias.

 

O sistema sueco baseiava-se num trabalho analítico, bastante rígido, com um desenvolvimento harmónico de todo o corpo, exercícios simétricos moderados e de fácil compreensão, realizados com uma dificuldade progressiva e, de preferência, sem aparelhos, em pé e obedecendo a uma voz, embora também existam ns exercícios com aparelhos simples: cambalhotas, suspensões, equilíbrios, etc. Tudo isso era suportado pelo estudo de base biológica das formas e efeitos dos exercícios; trata-se de uma ginástica "para todos os públicos».

 

Hjalmar Ling (1820-1866) foi o seguidor e sistematizador das ideias do seu pai e centrou-se no âmbito infantil. Seguindo critérios fisiológicos, a aula de ginástica dividia-se em aquecimento, parte fundamental e relaxamento. Esta divisão utiliza-se ainda hoje, se bem que também se fale em parte inicial, principal e final.

 

A ginástica neo-sueca (Thulin, Falk, Bjôrkesten) surgiu durante a década de 40 como reação ao estatismo proposto pela ginástica idealizada por Ling. Esta nova modalidade utilizava o ritmo na execução de diversos exercícios que se podem ligar e incluem balanços e acrobacias. Posteriormente acrescentou-se também a expressividade e eliminou-se a vertente de formação militar.

 

 

OS SISTEMAS NATURAIS

 

A partir dos princípios expostos por Rousseau, Pestalozzi, Amorós, Muths e Demeny, ao longo dos séculos XIX e XX desenvolveram-se diversos sistemas naturais, de entre os quais se distinguem fundamentalmente dois: o método natural de George Hebert (1875-1956) e a ginástica natural escolar austríaca.

 

O primeiro desenvolveu-se em França, em contraposição à ginástica analítica sueca. Foi apresentado em Paris em 1913 e tinha como objetivo o desenvolvimento físico integral mediante atividades naturais do ser humano: marcha, corrida, salto, lançamento, quadrupedia, cambalhota, pesos, equilíbrio, luta, natação, dança, etc. Essas atividades realizavam-se ao ar livre, procurando incidir no desenvolvimento cardiovascular e pulmonar. Estes sistemas partem de uma conceção integral do indivíduo e apresentam um forte caráter pedagógico.

 

No início do século XX, Margarette Streicher e Karl Gaulhofer idealizaram a ginástica escolar austríaca, na qual recolheram distintos aspetos das escolas surgidas anteriormente: assim, por exemplo, do sistema de Jahn, os aparelhos; da ginástica sueca, o aspeto postural e higiénico; do método natural de Hebert, as atividades naturais; de Dalcroze, o valor do ritmo; e dos incipientes desportos que começavam a proliferar na Grã-Bretanha, o seu aspeto lúdico. O resultado consistiu em sessões de educação física muito completas, de quase 50 minutos, que incluíam uma fase de animação, outra de trabalho postural, para continuar com jogos, desportos, danças, acrobacias, e finalizar com exercícios de relaxamento. Streicher e Gaulhofer relacionaram os exercícios físicos, como agentes educativos, com as necessidades globais da criança. O método natural escolar austríaco foi atualizado durante a década de 70 por Gerard Schmidt, que respeitou a forma natural das crianças se expressarem através do jogo e interessou-se pelo seu próprio desenvolvimento evolutivo; incidiu sobre um trabalho multilateral, contrário à especialização, e defendeu o ecologismo na educação física.

 

 

O MOVIMENTO DESPORTIVO

 

Com Thomas Arnold (1795-1842) produziu-se uma autêntica revolução na Grã-Bretanha que logo se estendeu por todo o mundo ao introduzir o desporto nos centros educativos; juntaram-se os valores positivos e formativos do desporto, estabelecendo-se uma estreita relação entre o professor e o aluno. O auge desportivo do século XIX, propiciado também pela iniciativa de Pierre de Coubertin (1863-1937), que restaurou os Jogos Olímpicos e defendeu a prática desportiva na escola, e a sua decisiva importância na sociedade do século XX consolidaram o desporto como um bloco fundamental dos conteúdos da educação física.

 

 

OS SISTEMAS RÍTMICOS: DA DANÇA À AERÓBICA

 

Os precursores dos sistemas rítmicos foram Jean Georges Noverre (século XVIII) e François Delsarte (século XIX), e o seu expoente máximo, já no século XX, Jacobo Dalcroze (1885-1950), que aplicou a música à educação física e estudou o ritmo corporal. Também trabalhou a preparação física, a correção da postura, o desenvolvimento da imaginação, a espontaneidade, etc. A evolução deste sistema levou à ginástica rítmica desportiva.

 

Dentro dos sistemas rítmicos também se devem citar a ginástica expressiva de Isadora Duncan, a ginástica moderna de Rudolf Bode e a aplicação desta no campo masculino por parte do argentino Alberto Dallo. Os novos sistemas rítmicos são representados pelo gim-jazz (originário da Dinamarca) e pela aeróbica (cujo precursor foi Kenneth H. Cooper, nos Estados Unidos). Desenvolvidos nos últimos trinta anos do século XX, deram lugar a outras modalidades: step, funk; body pump, aquaeróbica, etc., que foram incluídas nas programações de educação física escolar.

 

 

ESCOLA NOVA E PEDAGOGIA AMERICANA

 

A Escola Nova é um movimento pedagógico de reação contra a escola tradicional que acentua a atividade da criança, tornada no centro da escola. A educação física, portanto, desempenha um importante papel nestas teorias. Entre os seus principais representantes destaca-se a italiana Maria Montessori (1870-1952), com a sua teoria da psicomotricidade, e o filósofo e pedagogo norte-americano John Dewey (1859-1952), que defendeu os campos de desporto como cenário de uma educação adequada para a vida. Influenciados por este último, apareceram três métodos da pedagogia americana: o método dos projectos (Kilpatrick), o plano Dalton (Parkhurst) e o sistema Winnetka (Washburne), os quais propiciaram muitos dos modelos de ensino utilizados hoje em todo o mundo: a atribuição de tarefas, o ensino recíproco, o ensino programado, a descoberta guiada, a resolução de problemas, etc.

 

 

EDUCAÇÃO FÍSICA NO SÉCULO XXI

 

As escolas, sistemas e movimentos evoluíram e avançaram para a educação física do século XXI, que tem como principal característica a sua consolidada inclusão no programa educativo de todo o mundo, enquanto elemento fundamental de uma educação integral. Porque, tal como dizia o espanhol José María Cagigal, a educação física «é, antes do mais, educação». Assim, a educação física do novo milénio colabora na formação de uma pessoa íntegra, procura o seu desenvolvimento psicomotor e fomenta a qualidade de vida através do exercício físico e do desporto; prepara o ser humano para as exigências que a sociedade lhe apresenta e desenvolve a sua criatividade e personalidade. Graças à educação física atual, democrática e integradora, as atividades físicas e desportivas irão tornar-se numa forma de ser, em companheiras inseparáveis no decorrer de toda a sua vida.

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